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quarta-feira, setembro 12, 2007

Público boquiaberto no castelo do Barba Azul
isabel delgado
Sally Burgess e Andrea Silvestrelli são vozes centrais nesta ópera


José Atalaya

João Henriques é o grande protagonista deste histórico Barba Azul, única ópera bartokiana (de 1911). Ele... o encenador ! Quase faz cinema, grandes planos dos rostos, palco aprofundado para o efeito. Sete portas transparentes ouvindo a imaginação do espectador. Para quê cenários ? Bastam os da nossa mente. Por cima, belíssimo painel em que dezenas de rectângulos multicolores de digladiam com uma precisão geométrica. A ópera - "O Castelo do Duque Barba Azul" - estreou anteontem na Casa da Música, no Porto.

Acento picante na história, ao transmutar (em homem) uma das três infelizes esposas que haviam precedido a ingénua Judite do conto infantil de Perrault. Ela largara família, noivo, tudo, ávida de conhecer (tudo, mesmo o que para ela seria inimaginável) o que o seu sinistro e amoroso barbudo guardava no lúgubre e enigmático castelo

Ao fazer ópera (sem palco de ópera) começa João Henriques por demonstrar ao espectador boquiaberto como se poderá, afinal, reinventar, aqui no Porto, o tradicional concerto sinfónico. Como? Inovação a nível mundial, se a Casa quiser criar novo público para a fruição inteligente e sedutora dos autores clássicos universais. É uma ideia. Encenar sinfonias, concertos, poemas sinfónicos, suites orquestrais com a continuação desta tão imaginosa criatividade de Pedro Cabrita Reis e João Coelho de Almeida (instalação de efeitos e desenhos de luz).

Entramos na sala, vemos diante de nós, por detrás de cortinas de vidro, a esplêndida Orquestra Nacional do Porto. Regida pelo jovem maestro que vai bisar na Ópera de Berlim (tudo dito...). Christoph König consegue coordenação flexível e atenta de toda a máquina interpretativa, a sua força interior é transbordante de musicalidade!

Há ópera? Acrescentam-se duas vozes magníficas. Sally Burguess (meio soprano, timbre aveludado, mas intenso, na expressão de dor que só explode no fim) sempre em confronto imparável, cada vez mais intenso no decorrer do drama, com as cavernosas profundidades, as líricas inflexões que vão reclamando amor - de um portentoso e certamente histórico desempenho do lendário Duque Barba Azul. O do estupendo barítono Andrea Silvestrelli.

Tudo o que nos iam dizendo, com orquestra, estes dois cantores, na poética expressividade de Béla Balázs, inspirada no conto de Charles Perrault, era projectado em legendagem, acompanhante passo a passo destes sinfónicos 60 minutos da avançada criatividade, na época, do genial Bartok, já então distanciado de "toques" 'straussianos' (algumas emoções orquestrais de "O Cavaleiro da Rosa"), das iniciais emanações harmónicas de Claude Debussy.

Casa cheia ! Aplausos intermináveis. Um bravo à Casa da Música por no-lo ter revelado no espectáculo inaugural de um ciclo de novas músicas - que promete!

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